domingo, 20 de setembro de 2009

Profecia de Sangue - Transformação - Cap.Um

(continuação)

***

Acordei.

Pisquei os olhos adaptando-os à escuridão. O quarto ainda estava escuro, apenas uma suave claridade entrava pela janela. Olhei para o relógio, ainda era de madrugada – 5h00 da manhã. Sentei-me na cama, começava a lembrar-me o motivo que me acordou, um pesadelo? Ou um sonho? Sim, um sonho, apenas um sonho. Nunca me lembro dos meus sonhos, mas aquele… Eu não estava nele, outras pessoas eram protagonistas, e, eu era um mero espectador.

Acordei um pouco mal disposto, enjoado. Mesmo antes de acordar, no meu sonho, consegui ver nitidamente que aquelas duas estranhas personagens estavam a ser atacadas por alguma coisa, isso deixou-me agoniado. Levantei-me, quando o fiz quase tropecei num dos caixotes, que deixei espalhados pelo chão – caixas para a mudança. O último dia de férias. No dia anterior, preparei tudo para levar, rumo a uma nova vida; uma nova aventura. Deviam de estar na garagem, bem que Sarah me avisou, como acabei tarde de empacotar todas as coisas deixei-as ali – não pensava em levantar-me tão cedo. Para não embater em mais nada, fui as apalpadelas, carreguei no interruptor mas nada aconteceu – Sarah mandou cortar a luz. Não poderia ser pior, para além de a minha cabeça andar a roda ainda tinha de adivinhar onde estavam os obstáculos – ainda bem que sempre fui dotado de boa memória e a casa ser de rés-do-chão, se tentasse descer escadas iria cair, de certeza. Não queria acordar Sarah, tentei abrir a porta do quarto sem fazer barulho; mas esta rangeu – um leve murmúrio no escuro. Sarah dormia sempre com a porta aberta e aquela noite não foi excepção. Senti-a mexer-se suavemente na cama, virou-se e ouvi um profundo suspiro – estaria também a sonhar? O ranger da porta não a acordou. Dormia profundamente, em alguns momentos suspirava, se estava a sonhar, não seria um sonho igual ao meu.

Deslizei até à cozinha – no fundo do corredor – tentando, mas em vão, caminhar suavemente como se estivesse a pisar uma nuvem, tal como um gato; mas, claro que não consegui, os meus passos lentos pareciam ainda mais pesados naquela escuridão, e, ainda mais por ser a minha intenção não fazer barulho. Tudo funcionava ao contrário do que eu pretendia. Na cozinha, a tarefa de não fazer barulho parecia impossível. E a minha cabeça, ainda não tinha parado de andar à roda e a sensação de enjoo aumentou com o esforço. Encostei a porta, para conseguir abafar o som; uma cadeira estava ligeiramente afastada que me permitia sentar sem ter de movê-la – fiquei grato a quem a deixou assim -, procurei no armário um copo; por sorte, um tinha ficado esquecido, peguei nele. Na mesa, Sarah deixou uma garrafa de água - completamente cheia, de certo para a viagem -, deitem um pouco no copo, sentei-me na cadeira e bebi de uma vez só. O mal-estar persistia, mantive-me sentado, com a cabeça pausada nos braços, cruzados sobre a mesa.

Fechei os olhos por uns momentos; e, os olhos arregalados de horror daquela mulher – Laura, era como lhe chamava a outra personagem do meu sonho -, voltaram. Foi um sonho, tentava lembrar-me a mim mesmo, parecia demasiado real. O seu rosto ficou gravado na minha memória, nunca iria esquecer aquela expressão de dor, medo, de puro terror – mesmo sendo apenas um sonho. Acordei antes de conseguir ver o rosto do seu assassino – ou, será que me esqueci. O que os terá assustado tanto? Um urso, lobo? Ou será que era… Nos sonhos costumam aparecer as coisas mais inacreditáveis. Criaturas mágicas, míticas… Mas porquê? Porque sonhei este sonho? Os sonhos não têm razão, e muito menos sentido, mas não deveria ser eu a aparecer nesse sonho?

Levantei-me, depressa de mais pelo que parece, a minha cabeça girou. O enjoo não passou, piorara. Devagar abri a porta e fui até à casa de banho; o esforço adicional para não fazer barulho só conseguia pôr-me ainda pior – como se isso fosse possível. Fantástico, o dia prometia, já começava a detestar aquela mudança. Pelo menos não tive de ter um cuidado adicional para abrir a porta da casa de banho, visto que esta estava já aberta – o que me agradou, já não suportava todo aquele esforço de parecer um gato silencioso na noite.

No espelho - quase não me reconheci – revelou-se um rosto demasiado pálido. Os meus olhos, enevoados, não me deixavam ver nitidamente o que estava à minha volta. Nada a fazer, os meus esforços iam mesmo por água abaixo; abri a torneira e um fio de água começou a correr; lavei a cara com um pouco de água fria, só esperava que aquilo ajudasse e que Sarah não acordasse – não estava com disposição para a sua preocupação excessiva.

Nas minhas mãos em forma de concha, a água parecia uma tela que reproduzia o rosto de Laura - o rosto da vítima consciente da sua morte, fixos nos olhos do seu assassino.

(continua...)

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