quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Prof.Sang.-Transf. - Cap.Um

(continuação)

Nas minhas mãos em forma de concha, a água parecia uma tela que reproduzia o rosto de Laura - o rosto da vítima consciente da sua morte, fixos nos olhos do seu assassino. Num impulso abri as mãos e o seu rosto desfez-se com o correr da água; molhei novamente o rosto sem olhar – queria esquecer aquele sonho ridículo, de pessoas que não conhecia, e um lugar que nunca vira.

Finalmente o enjoo davas sinal de abrandar, não totalmente, mas, pelo menos, já me permitia voltar para o meu quarto, sem correr o risco de derrubar alguma coisa no caminho – o que duvidava graças à minha crescente tendência para isso.

Uma serena e suave luz iluminava o quarto escuro. Conseguia ver as caixas no chão – agradeci, pois seria mais fácil tentar não tropeçar nelas -, contornei-as com cuidado, mas em vão, ainda embati numa delas. Gemi. Com o ligeiro tremor provocado pelo embate, a caixa entreabriu-se e pude ver o que continha lá dentro – as coisas do liceu (fotografias, troféus…). Abri a caixa com cuidado – já não ia conseguir dormir -, estava cheia até ao topo. Um cofre de lembranças. Nunca tive razões de queixa do liceu, não fui popular, mas, também não pertencia ao grupo dos torturados. Bons tempos…

Não me lembrava de ter tirado tantas fotografias; um pequeno álbum chamou a minha atenção. Peguei nele, não me lembrava dele, só quando o abri, percebi que não era meu. Na primeira página estava escrito, numa escrita perfeita:

“Para o meu melhor amigo. Nunca te vou esquecer, e espero que nunca te esqueças de mim. Guarda isto como um tesouro, perto do coração. Adoro-te. Beijos Kelly.”

Um presente de despedida; senti os meus olhos húmidos à medida que esfolheava cada página. Kelly, sempre foi uma amante de fotografia, e era óptima fotógrafa, conseguia imagens fantásticas. Ofereceu-me um álbum de fotografias nossas, repleto delas; tirava fotografias por tudo e por nada, fazia questão de registar todos os momentos – sorrisos, gargalhadas, caretas… Detive-me numa em particular, lembrava-me perfeitamente daquela fotografia – foi o dia em que consegui tirar-lhe a máquina, ela não queria -, ainda me conseguia lembrar desse dia perfeitamente.

- Alex pára. Estou a avisar-te, devolve-me a câmara – tentava tirar-me a máquina.

- É a minha vez…Vá lá, Kelly, um sorriso… - ela suspirou e um sorriso brilhante rasgou-lhe o rosto. – Assim já gosto mais - e, tirei a fotografia.

A minha fotografia favorita, não por ter sido eu a tirá-la, mas por ser uma fotografia dela – só dela. Estava linda, os olhos verdes brilhavam, as suas feições estavam perfeitas, numa pele suave branca como a neve, com um ligeiro rubor nas faces devido ao esforço.

(continua...)

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