sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

O Coração de Nazul - Cap. III

Capitúlo III

Da outra margem do rio, em terras de Nazul, preparava-se uma batalha contra os humanos, uma criatura vil que nunca aceitou as regras impostas pelo Rei, colhia forças ocultas para vencer as barreiras colocadas por ele. Esta vil criatura de nome Grima encontrava-se refugiada nas montanhas vulcânicas, terra distante, toda essa região se caracterizava por uma enorme escuridão, parecia ser sempre noite, nunca se via sinal de vida.
Grima fora outra ora como todas as outras criaturas de Nazul, numa época sem barreiras, em que apenas existia o mundo Nazul e os humanos não passavam de escravos nas suas mãos. Nunca aceitou o facto do Rei ter tomado a decisão de tornar os humanos livres, por isso, fora banido para aquelas terras de que agora é senhor. Desde, então que jurou vingança e prepara uma forma de derrotar o Rei e fazer valer os seus ideais.
Longe de todos na sua caverna formada pelas antigas erupções vulcânicas, podia conspirar contra o reino sem ser notado. Toda a caverna era escura, tão escuro como toda a região, a única fonte de luz e de algum calor era a fogueira que mantinha acesa. Ao lado da fogueira era onde Grima se mantinha a maior parte do tempo, uma criatura que fora outra ora tão bela e perfeita, transformara-se pelo tempo, o ódio e o rancor. No seu coração residia há muito a escuridão que caracterizava aquele lugar. É agora uma criatura vil, temível por todos, apresenta sempre um semblante carregado, cabelos esguios negros como a noite, a face pálida como a neve e os olhos cavos como se não dormisse anos seguidos, vestia uma grande túnica negra. Toda a sua figura transmitia aquilo que carregava no coração negro, incapaz de sentimentos de bondade. Sempre fora diferente de todos, a sua mente era sombria e perversa, constantemente procurava novas formas de torturar os humanos para seu belo prazer, desprezava-os por serem meros mortais, sem poderes mágicos. Praticante da magia negra em segredo, testava os seus feitiços nos humanos, muitos deles acabam por morrer nas suas mãos. Mas não estava só, outros haviam que partilhavam dos seus planos. Grima tornara-se mestre para alguns que começavam a seguir os seus passos.
A espécie humana estava a ser ameaçada, Grima não tinha escrúpulos, matava-os sem dó nem piedade, mulheres até crianças. Foi perante esta situação que o Rei tomara aquela decisão, era um ser bondoso e não suportava mais ver os humanos a serem mortos pelo mero prazer de uns.
Grima preparava planos terríveis, reunira um exército temível de criaturas que fizera imergir das profundezas por meio da magia negra, criaturas sem alma, sem medos, capazes de destruir e matar, mortos vivos que noutros tempos foram criaturas doces, negros como a noite, os olhos vermelhos cobertos de sangue, temíveis guerreiros, fortes e muito altos. Não eram como os lobos que caminham vivos pela terra, estes estavam muito melhorados, conseguiam andar sob os membros inferiores como os homens, possuíam mãos firmes capazes de envergar armas.
Estas criaturas escutavam as ordens de seu mestre e senhor, preparadas para matar por ele.
“O dia chegou meus fiéis servidores, hoje vai se dar início há batalha pela nova Era! Uma Era que nunca deveria ter sido interrompida!” – dirigindo-se aos seus lacaios – “Vão, encontrem-no e tragam-mo até mim! Ele tem de ser meu!”
Perante a ordem do mestre, sem sequer hesitar, seguiram o seu caminho. Mas estas não eram as únicas criaturas que se encontravam ao lado de Grima, outras de coração negro como ele seguiam os seus ideais e partilham o mesmo ódio pelo pelos seres mortais e pelas leis que vigoram em terras de Nazul de agora.

Entretanto, Land percorria o trilho que levava até ao rio, estava quase a anoitecer, tinha de se despachar. Finalmente chegou. Parou algum tempo a contemplar a paisagem, continuava sem querer acreditar em tudo que Mad Merry lhe contou, como era possível um lugar tão belo poder esconder algo tão perigoso. Cauteloso, aproximou-se da margem do rio, entrou, seguiu até ao centro, o nível da água chegava-lhe até à cintura, muito serena, era impossível os dois amigos de Mad Merry terem morrido afogados ali. Acariciando a água com a sua mão direita, Land começara uma forma de diálogo, não sabia ao certo com quem ou o quê, nem fazia ideia de como deveria se dirigir, mas precisava tentar, tinha de conseguir atravessá-lo.
“Não sei que nome te devo dar! Conheço a regra que defendes, sei que não permites a passagem! Mas eu peço-te, humildemente, que me permitas essa honra!”
Nesse momento a respiração de Land ficara ofegante, o seu coração parecia querer saltar-lhe do peito. Um enorme silêncio incomodativo se instalou, Land apenas ouvia a sua respiração cada vez mais ofegante e o seu coração a bater cada vez mais forte. Então começou a perceber de que o nível do rio estava a baixar e numa estrondosa explosão de água à sua frente imergiu uma figura esbelta, toda ela formada pela água do rio, era uma imagem de uma mulher, tal como Mad Merry descrevera. Conseguia-se distinguir as formas de uma bela mulher, com cabelos muitos compridos ondulados até aos joelhos, podia mesmo ver através dela de tão cristalina que era a água. Era exactamente como Mad Merry lhe contara, afinal sempre era verdade a sua história, não estava louco, mas mais lúcido do que os outros. Uma história que para Land era inacreditável, nunca acreditou nelas, mas ali estava bem à sua frente uma das personagens da história de Mad Merry.
A Senhora do Rio ali à sua frente, uma imponente figura, olhava agora para Land, que não tinha conseguido tirar os olhos dela, todo o seu corpo começara a tremer, a garganta secou, estava pela primeira vez da sua vida a sentir a sensação de medo.
“Ninguém pode atravessar o rio, é proibido! A desobediência dessa regra é punível com a própria vida!” – disse aquela estanha criatura.
“Não, espera, por favor! Perdoa-me, nunca foi minha intenção ofender-te! Mas, temo que tenho de atravessar! Alguém chama por mim do outro lado!”
A Senhora do rio o olhou nos olhos e para surpresa de Land também ela conhecia o seu nome: “Land!”
“Sabes o meu nome? Sabes quem sou? Era tua a voz que chamava por mim? Conheces aquele a quem pertence essa voz? Diz-me, por favor!”
As perguntas de Land não obtiveram respostas. Toda a água que a formava desmanchou-se sob ele e a força dela o arrastou até à outra margem. Land agora percebera como aqueles dois se tinham afogado, cansado e molhado arrastara-se mais um pouco e deitou-se sob o chão, ficou ali algum tempo, quase desmaiado. Mas, não podia ficar ali, tinha de continuar a sua busca. Assim com um enorme esforço, as mãos bem firmes no chão, se levantou lentamente, a poucos metros estava da Floresta, ou, talvez, da passagem para outro mundo. Já de pé, mas bastante exausto, caminhava em direcção da Floresta, assim que chegou perto das árvores hesitou, olhou para trás e veio-lhe à lembrança Claire, voltará a vê-la? Land fechou os olhos e voltara-se, novamente, para a frente, não podia voltar a trás, tinha de seguir caminho.
As árvores eram magníficas, Land nunca tinha percebido, agora contemplava-as, muito altas e verdes, enormes monumentos vivos. A noite aproximava-se e Land não podia arriscar andar pela Floresta repleta de riscos desconhecidos, tinha de aproveitar antes que a escuridão plena da noite o impedisse de seguir o seu caminho. Respirando fundo, sentia o cansaço a querer derrubá-lo, mas não podia ceder, tinha de continuar. Ao sentir uma certa dificuldade em se manter de pé apoiou-se no tronco muito grosso de uma das árvores, eram realmente impressionantes, deviam ser muito antigas. Land entrou, finalmente, na tão temível Floresta, ficara fascinado, nunca vira tanta beleza, todo aquele lugar parecia cintilar, tudo era mágico. As árvores enormes e muito belas, ouvia o chilrear dos pássaros nos seus ninhos, tudo estava tão calmo, o chão repleto de flores e erva verde, a lua que já se encontrava no alto do céu reflectia uma luz da cor de prata em toda aquela paisagem, já por si tão bela.
Land olhava em seu redor contemplando toda aquela beleza, procurava algum sinal de alguém que o pudesse orientar, mas não via ninguém. Estava cada vez mais fraco, todo encharcado. Começou, então a caminhar, apoiando-se nas árvores por onde passava, tinha de sair dali, encontrar alguém.
Land não estava só, sentia que estava a ser observado, mas não conseguia ver nada. No cimo das árvores muitos animais o observavam, não era usual a presença de estranhos por ali. Sentia que os pássaros deixaram de cantar, estavam agitados, foi, então, que uma das aves voou por cima de si, levantou a cabeça e viu um grande pássaro a voar à frente dele, onde iria?
A tão temível Floresta, não parecia assim tão perigosa, pelo contrário, transmitia uma enorme calma e serenidade. Mas de repente, Land sentiu algo de estranho, parou e ficou a ouvir, o som não vinha longe, fazia lembrar-lhe os trabalhadores de madeira da aldeia. O som vinha por de trás dele, ao dar a volta para ver o que era, fora surpreendido por uma mão gigante de uma árvore que o agarrara e elevara no ar. O coração de Land batia fortemente no seu peito, que doía devido a respiração débil. Aquela mão apertava-o cada vez mais e Land contorcia-se de dor. Não queria acreditar à sua frente estava agora uma face enorme de madeira, era uma árvore.
“Os humanos não são permitidos deste lado da margem do rio! Como passas-te pela Senhora do Rio? Deves ser punido!”
Land gemia de dor, aquela árvore espremia-o. Por momentos pensou que era o fim, mas não podia deixar que aquela criatura o matasse, tinha de conseguir convencê-la de que não tinha a intenção de violar qualquer lei.
“Vim em paz…por favor…ouve-me! Preciso continuar, alguém desta terra me tem vindo a chamar!”
A árvore não cedia, cada vez mais apertava-o, foi, então que uma luz brilhante surgiu iluminando toda a Floresta, fazendo com que a pressão cedesse e sem que Land entendesse a árvore colocara-o no chão.
Devido ao cansaço a sua visão começava a turvar-se, deixara de ouvir a melodia, apenas a sua respiração cada vez mais fraca. As suas pernas deixaram de lhe obedecer, caiu por terra, foi, então, que na sua frente aparecera duas figuras que lhe ofuscavam o olhar com o seu brilho.
“Quem está aí? Mostra-te! Podes ajudar-me?” – perguntava Land numa voz já débil, mas não obteve resposta.
Aquelas duas figuras aproximavam-se de Land, que agora conseguia distinguir um homem, de cabelos e barbas compridas brancas, vestia uma túnica até aos pés branca como a neve que cintilava. Ao seu lado estava um cavalo branco, mas tinha uma espécie de corno, era um unicórnio, nunca tinha visto nenhum, pensava que era só uma lenda, também ele reluzia muita luz, era tão belo. Ambas as criaturas tinham um aspecto sereno e calmo, não tinham a intenção de magoa-lo, só ajudar. Mesmo antes deles chegarem até Land, ele não aguentou, por fim cedeu ao cansaço e desmaiou.

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